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quarta-feira, 9 de junho de 2010

Carta Maior - A maneira estranha de Serra combater os adversários: Dossiê - Contra Aécio e todos que atravessarem seu caminho."Os xiliques de Serra e a agressividade dos recados emitidos pelos jornais serristas demonstravam que nem um, nem outro, confiavam de fato nos confortáveis índices oferecidos à opinião pública interna e externa pelo instituto de pesquisas da família Frias. É nessa linha de tensão que surge o artigo “Pó pará, governador?” cujo título trazia uma insinuação de represálias sem limite, caso Aécio Neves insistisse em se colocar na disputa contra o tucano paulista. A sombra da represália, por certo em munição letal, tanto que Aécio desistiu da candidatura – ficava explícita no parágrafo final do recado assinado pelo versátil porta-voz de interesses inconfundíveis, o jornalista, advogado, escritor, administrador de empresas, pintor e etc, Mauro Chaves. Depois de denunciar o controle do mineiro sobre a imprensa do Estado [ "em Minas imprensa e governo são irmãos xifópagos"], o texto concluía: “Aécio devia refletir sobre o que disse seu grande conterrâneo João Guimarães Rosa: “Deus é paciência. O diabo é o contrário. E hoje talvez ele advertisse: Pó pará, governador?”.

Era uma chamada enigmática para alguns, mas inteligível para os círculos que já ouviram insinuações recorrentes sobre hábitos pessoais do governador.

Saul Leblon, na Carta Maior

Jornalista Luiz Lanzetta quer depor sobre suposto dossiê
Ele diz que pretende depor 'no Congresso ou em praça pública'.
Ex-assessor se desligou do comitê de campanha de Dilma Rousseff.

Da Agência Estado
Eu falo em qualquer lugar, em praça pública, quero falar, quero que me convoquem. Uso até PowerPoint"

Luiz Lanzetta

Pivô do primeiro escândalo da disputa presidencial deste ano, o jornalista e consultor Luiz Lanzetta disse no domingo (6) estar à espera de uma convocação para depor sobre encontro que teve com arapongas de Brasília, alguns ex-agentes e servidores da Aeronáutica e da Polícia Federal, especializados em produzir dossiês contra adversários políticos de seus clientes.

Lanzetta, que trabalhava para a campanha à Presidência da ex-ministra da Casa Civil Dilma Rousseff, se desligou anteontem do comitê petista, após a divulgação do encontro com os espiões, há um mês e meio.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o jornalista adiantou que pretende, ao depor "no Congresso ou em praça pública", dar detalhes da conversa que teve com o ex-agente do serviço secreto da Aeronáutica Idalberto Matias de Araújo, o "sargento Dadá", e o delegado aposentado Onézimo Souza, no restaurante Fritz, em Brasília, no dia 20 de abril.

O encontro foi divulgado pelo jornal O Estado de S. Paulo no sábado. "Ele (Onézimo) falou da estrutura do esquema de espionagem do Marcelo Itagiba", disse Lanzetta, referindo-se ao deputado do PSDB do Rio de Janeiro, ligado ao presidenciável José Serra. Itagiba também é delegado da Polícia Federal. "Ele falou que Itagiba tinha cem dossiês contra a base aliada, não era apenas contra o PT."

Tucanos

Lanzetta disse que o "outro lado", isto é, o PSDB, é que precisa dar explicações sobre o escândalo. "O problema está do outro lado", reforçou. "Eu falo em qualquer lugar, em praça pública, quero falar, quero que me convoquem. Uso até PowerPoint", completou. O jornalista disse que desafia Onézimo a dar sua versão do encontro. "Está muito claro que há uma armação contra a gente."

Durante a entrevista, Lanzetta repetiu diversas vezes que não aceitou a proposta de arapongas para comprar dossiês. Ele disse ter recusado, ainda no restaurante, o serviço oferecido pelos espiões para produzir material contra os adversários da base aliada. "A gente sabe, tem memória", completou.

O caso do suposto dossiê

Enviado por luisnassif, qui, 03/06/2010 - 16:18

A história é outra.

Quando começou a disputa dentro do PSDB, pela indicação do candidato às eleições presidenciais, correram rumores de que Serra havia preparado um dossiê sobre a vida pessoal de seu adversário (no partido) Aécio Neves.

A banda mineira do PSDB resolveu se precaver. E recorreu ao Estado de Minas para que juntasse munição dissuasória contra Serra. O jornal incumbiu, então, seu jornalista Amaury Ribeiro Jr de levantar dados sobre Serra. Durante quase um ano Amaury se dedicou ao trabalho, inclusive com viagens à Europa, atrás de pistas.

Amaury é repórter experiente, farejador, que já passou pelos principais órgãos de imprensa do país. Passou pelo O Globo, pela IstoÉ, tem acesso ao mundo da polícia e é bem visto pelos colegas em Brasília.

Nesse ínterim, cessou a guerra interna no PSDB e Amaury saiu do Estado de Minas e ficou com um vasto material na mão. Passou a trabalhar, então, em um livro, que já tem 14 capítulos, segundo informações que passou a amigos em Brasília.

Quando a notícia começou a correr em Brasília, acendeu a luz amarela na campanha de Serra. Principalmente depois que correu também a informação de um encontro entre Lanzetta e Amaury. Lanzetta jura que foi apenas um encontro entre amigos, na noite de Brasília. Vá se saber. A campanha do PT sustenta que Lanzetta não tem nenhuma participação na campanha.

Seja como for, montou-se de imediato uma estratégia desesperada para esvaziar o material. Primeiro, com os ataques iniciais a Lanzetta, que poucos entenderam o motivo: era uma ameaça. Depois, com a matéria da Veja.

A revista foi atrás da história e tem, consigo, todo o conteúdo levantado por Amaury. Curiosamente, na matéria não foi mencionado nem o nome da filha de Serra, nem o do repórter Amaury Ribeiro Jr. nem o conteúdo do suposto dossiê.

O Globo repercutiu a história, dando o nome da filha de Serra, mas sem adiantar nada sobre o conteúdo das denúncias – medida jornalisticamente correta, se fosse utilizada contra todas as vítimas de dossiês; mas só agora lembraram-se disso.

Provavelmente Veja sairá neste final de semana com mais material seletivo do suposto dossiê. Mas sobre o conteúdo do livro, ninguém ousa adiantar.

Serra é o rei dos dossiês.

O araponga da Veja trabalhou para ele. Onésimo e Itagiba - os olhos e ouvidos do Zé Ladeira (abaixo)

Resgate de reportagem de 2002, demonstra relações de Serra com Onézimo

A edição de 14/03/2002 o jornal Correio Braziliense veio com a seguinte matéria demonstrando as relações de José Serra, com o ex-delegado Onézimo das Graças Souza:
Na Saúde, Serra multiplicou gastos com empresa de ex-agente do SNI

Luiz Alberto Weber
O Ministério da Saúde, onde até 21 de fevereiro último despachava o candidato tucano à Presidência, José Serra, tem uma forte proximidade com escutas telefônicas — mas do outro lado balcão.

Serra, quando ainda ministro, autorizou a contratação por R$ 1,8 milhão da empresa carioca Fence Consultoria Empresarial, especialista em detectar escutas clandestinas. Só neste ano, a Fence recebeu do ministério R$ 226 mil, o que torna o órgão o maior cliente da empresa carioca dentro do governo.

Os valores recebidos pela Fence e sua própria existência acrescentam mais combustível ao dossiê que investigadores privados do PFL tentam montar para apontar o envolvimento de integrantes do governo em suposta escuta montada no escritório da empresa Lunus, de propriedade da governadora Roseana Sarney.

Atribui-se a um grampo clandestino o fato de a Polícia Federal ter sido alertada e descoberto que os cofres da Lunus guardavam R$ 1,34 milhão, que seriam usados na campanha da candidata do PFL à Presidência.

O dono da Fence, Enio Gomes Fontenelle, é um ex-coronel do Exército que por muitos anos trabalhou no extinto Serviço Nacional de Informação (SNI), órgão de investigação oficial durante a ditadura militar, que desapareceu para dar vez à Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Ex-chefe da área de comunicações do SNI, Fontenelle é um craque em espionagem eletrônica. Antigos agentes do SNI atribuem a Fontenelle a modernização do arsenal tecnológico da agência nos anos 80.

O coronel chegou a comandar um grupo que desenvolveu aparelhos de escutas com tecnologia nacional em substituição aos importados. Depois de aposentado, especializou-se em combater os grampos. Entre os clientes da Fence, estão o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a hidrelétrica de Itaipu. A empresa é respeitada no mercado pela competência tecnológica e discrição.

Nos últimos meses, Fontenelle esteve várias vezes no Ministério da Saúde, onde encontrou-se com Serra. Hoje, cerca de 600 telefones e ambientes (salas de reunião e gabinetes) são monitorados pela Fence no ministério.

A empresa rastreia, principalmente, a existência de grampos ou emissores de rádio clandestinos, com capacidade de transmitir conversas para um interceptador posicionado a até 100 metros de distância.

O coronel tem outro conhecido comum com Serra: o delegado da Polícia Federal Marcelo Itajiba. O delegado foi assessor do candidato tucano em Brasília. Mas, antes de desempenhar essa função burocrática, era chefe do Centro de Inteligência da PF, a mais produtiva instaladora de grampos legais a serviço do governo. No ministério, Itajiba montou uma mini-central de inteligência, que contou com a participação dos delegados da PF Onésimo e Hercídio.

Itajiba é da copa e cozinha do ex-ministro. Serra tentou, sem sucesso, fazê-lo diretor-geral da Polícia Federal, em 1999. Hoje, o delegado está no Rio, assim como Fontenelle. ‘‘Conheço o delegado, mas apenas de contatos superficiais’’, disse Fontenelle ao Correio.

Segundo a assessoria do ministério, o reforço no orçamento anual da Fence (que mal passava de R$ 100 mil) deveu-se ao temor de Serra de ser grampeado por representantes das indústrias de tabaco e de medicamentos, que tiveram interesses contrariados pelo ex-ministro.

Assessores do ex-ministro dizem que durante a campanha pela popularização dos remédios genéricos e contra o cigarro Serra amealhou muitos inimigos. Antes, a varredura (como é chamado o trabalho de localização de escutas) era mensal. Hoje, segundo informações da segurança do ministério, ela é semanal. Registre-se, porém, que as batalhas de Serra contra o fumo e contra os grandes laboratórios datam de dois anos atrás e hoje as relações estão pacificadas.

As investigações realizadas pelos arapongas do PFL sobre os autores do suposto grampo na sede da Lunus haviam apontado, primeiro, para a possibilidade de envolvimento de uma empresa de Brasília, a Interfort Sistemas de Segurança.

As suspeitas contra a Interfort deveram-se ao fato de José Heitor Nunes, gerente da empresa, ter estado várias vezes no Maranhão nas semanas que antecederam a invasão da Lunus.

O que o PFL desconhece é que o coronel Fontenelle (ex-integrante do SNI), o delegado Itajiba e Onésimo (ex-chefe da área de Inteligência da PF) e Nunes (dono de uma empresa que presta consultoria para PF na área de escutas) se conhecem.

Ex-militar do Exército, Nunes tem trânsito livre nos órgãos do governo dedicados a fazer investigação. Como consultor de segurança, Nunes dá aulas para os arapongas da Polícia Federal e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Durante sua militância empresarial e militar, conheceu Itajiba e o coronel Fontenelle. É ainda amigo do delegado Onésimo, que também trabalhou com Serra e hoje presta servivo à empresa ControlRisk, especialista em investigações e medidas de segurança.


OS DOSSIÊS E OS INVESTIGADOS

Ao que tudo indica, os agentes que se espalharam pelo país produziram vários dossiês diferentes. As primeiras informações sobre eles começaram a circular na semana seguinte à apreensão dos documentos e da bola de R$ 1,3 milhão no escritório da Lunus, da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e de seu marido, Jorge Murad.

Contra Lula e Roseana

O candidato do PPS à Presidência da República, Ciro Gomes, foi o primeiro a denunciar a existência de uma estrutura de arapongagem. Segundo ele, havia um grupo de 40 pessoas plantado em São Paulo para bisbilhotar a vida dos possíveis adversários do candidato do PSDB à Presidência, José Serra. Os principais alvos seriam, segundo Ciro, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, e Roseana Sarney, do PFL

Sarney também se queixa

O senador José Sarney (PMDB-AP), pai de Roseana, obtém informações semelhantes. No mês passado, ele se queixou ao presidente Fernando Henrique Cardoso sobre essas suspeitas

Dossiê para Garotinho

O governador do Rio e candidato do PSB à Presidência da República, Anthony Garotinho, informa que foi procurado por um político do PSDB, a mando do deputado Márcio Fortes (PSDB-RJ), que pretendia lhe passar um dossiê com denúncias contra Roseana Sarney

Uma revista

O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, também afirma ter tido acesso a um dossiê. Ele teria informações que embasariam reportagem de uma revista de circulação nacional

Foto comprometedora

O presidente do PTB, deputado José Carlos Martinez (PR), que articula uma aliança com Ciro Gomes, foi fotografado com uma amiga durante uma viagem a Miami. Uma revista de circulação nacional iria publicar a foto. Martinez procurou a direção da empresa e conseguiu evitar a publicação

Também contra Tasso

O governador do Ceará, Tasso Jereissati, que chegou a disputar com Serra a indicação do PSDB para ser candidato à Presidência, também foi investigado. Os arapongas ainda seguiram seu irmão, o empresário Carlos Jereissati. Ele é sócio do marido de Roseana, Jorge Murad, em um shopping center em Porto Alegre (RS).

Em tempo: em 14/03/2002, quando publicou esta corajosa reportagem de Luiz Alberto Weber, o jornal Correio Braziliense provavelmente tinha um também destemido diretor de redação. Pena que, hoje, sejam raros os jornalistas dessa estirpe.

Para desviar de assuntos inconvenientes, “dossiê

Folha, drogas, mentiras & dossiês

Numa versão dissimulada da manipulação que Veja e Globo fizeram de forma escancarada na última semana, a Folha de S.Paulo resolveu contar ao seu leitor na edição de sábado, dia 5 de junho, um pedaço – ínfimo – da verdadeira história por trás do suposto dossiê contra José Serra que abala a campanha demotucana e ressuscita velhas torpezas presentes nas disputas presidenciais desde o fim da ditadura. O artigo é de Saul Leblon.

Saul Leblon, na Carta Maior

O resumo-malabarista dos acontecimentos não é assinado, o que desde já sugere um produto distinto da reportagem e mais próximo de uma alta “costura’”política destinada a salvar as aparências perante leitores e eleitores depois do fiasco da operação-dossiê, que consistia em desqualificar denuncias graves –alucinadamente sempre omitidas – com o carimbo antecipado de conspiração petista. O que parece ter dado errado nesse exercício tantas vezes bem sucedido é que, primeiro, as informações negadas pelos jornalões vazaram e circulam livremente na Internet (leia http://www.conversaafiada.com.br/]; segundo, e mais complicado, a origem guarda credibilidade distinta dos dossiês eleitorais na medida em que se apóia em investigação minuciosa, ancorada em documentações muitas vezes chanceladas pela Justiça.

Na corrida contra o prejuízo, o produto oferecido aos leitores da Folha mantém a marca registrada de um certo padrão de jornalismo dissimulador , feito para confundir quando a missão de informar se revela inconveniente. É isso que está em marcha nesse momento em relação ao episódio do suposto dossiê. De forma coordenada, veículos diferentes armam um vertiginoso quebra-cabeças feitos de peças conflitantes que não se completam nunca. Dilui-se assim o que é central numa conveniente trama de sub-enredos reais ou imaginários. Valores em dinheiro totalmente contraditórios são jogados sem explicação. Declarações desencontradas diluem o principal em uma miríade de especulações laterais. Um mesmo personagem faz declarações diametralmente opostas em veículos diferentes, às vezes no mesmo dia. Sobre essa calda pegajosa que aos poucos satura e repugna mantém-se o guarda-chuva que interessa fixar. O vírus permanente da suspeição em relação ao governo, seu partido, sua candidata, seus métodos, a origem dos seus recursos, as relações internas entre seus membros enfim, tudo e todos que gravitam ao seu redor.

A chamada da primeira página da Folha segue a regra – “Jornalista e delegado são pivôs do caso do dossiê”. Não há, a rigor, qualquer respaldo para essa manchete nas informações contidas na matéria interna que na verdade a desmente, ao admitir:

a) ao contrário do que Serra afirma e a Folha endossou obsequiosamente no noticiário generosos dos dias anteriores, e continua a insinuar na manchete, o comando da campanha de Dilma em Brasília não contratou nem produziu dossiê algum contra o candidato do conservadorismo brasileiro;

b) os personagens que a manchete arrola como ‘pivôs’ do caso do dossiê teriam participado, diz a matéria, de uma conversa com um publicitário indiretamente ligado à campanha do PT;

c) sempre segundo o padrão Folha de jornalismo, em meados de abril, cogitou-se criar um sistema de inteligência no comitê de Dilma, em Brasília, para detectar a presença de eventuais espiões de Serra –suspeita ancorada em sucessivos vazamentos de informações confidenciais sobre custos e recursos envolvidos na campanha;

d) a criação do ‘serviço’ relatado pela Folha –com as ressalvas anteriores sobre a qualidade da informação prestada por esse jornalismo— teria sido abortada por uma divergência de preço. Ponto. Mas e o dossiê que a Veja denunciou, o Globo repercutiu e a Folha escorou dando destaque às declarações de Serra que afirma ser de responsabilidade ‘exclusiva’ de Dilma? Aspas para o texto da Folha, novamente: a) ‘em 2 de maio’, diz o relato apócrifo, integrantes do PSDB souberam que a campanha de Dilma estaria montando [a mencionada] equipe de “inteligência” com o objetivo, deduziram, de espionar Serra’ Fecha aspas. Quem ‘deduziram’?

A matéria não esclarece, nem questiona. A Folha não revela sequer curiosidade em relação a esse núcleo central da trama que ao deduzir erroneamente –pelo que diz o próprio jornal– criou o factóide surrado do ‘dossiê petista’, no qual embarcaram todos os veículos, bem como o candidato demotucuno, que o PT ameaça levar à justiça para provar a acusação criminosa contra Dilma Rousseff. Por fim, mas não por último, resta a embaraçosa omissão da matéria da Folha sobre o mais importante: o conteúdo efetivo dessas informações cuja divulgação – ‘circula na Internet’, diz o texto– estremeceria a campanha demotucana, a ponto de se montar um coro despistador na tentativa de desqualifica-las por antecipação.

A dificuldade em tratar o principal é um sintoma da gravidade do que se tenta esconder. Um primeiro ponto remete ao autor das informações em litígio. Sobre esse personagem que a Folha conhece porque admite que já trabalhou na sua redação, bem como na de outros veículos de igual calibre, o texto faz menção curta sem abrir aspas para a entrevista óbvia que o assunto merece. Diz o jornal: ‘ Amaury Ribeiro Júnior … investigou por anos o processo de privatização brasileiro iniciado nos anos do governo FHC (1995-2002)’.

Omitiu a Folha aquilo que ela e todo o meio jornalístico sabem : o jornalista Amaury Ribeiro Júnior é dono de três prêmios Esso; vernceu quatro prêmios Vladimir Herzog, é membro do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, apenas para citar alguns dados sobre a credibilidade do profissional que investigou e reuniu as informações escondidas pelo sistema midiático ao qual ele pertencia até recentemente. Não estamos falando portanto de uma Eliane Catânhede. Em frente.

Segundo a Folha a) ‘os dados começaram a ser coletados [por Ribeiro Jr] em sua passagem pelo “Estado de Minas”, principal diário mineiro, próximo politicamente do ex-governador Aécio Neves (PSDB-MG)’ ; b) ‘a apuração começou em 2009, depois que Aécio, então ainda um potencial presidenciável, foi alvo de reportagens críticas…” Alvo de quem? Curioso, no parágrafo anterior, a Folha desqualifica o trabalho investigativo do jornalista ao espetar no “Estado de Minas” o epíteto: ‘próximo politicamente do ex-governador Aécio Neves (PSDB-MG)’, mas nada relaciona sobre a ‘proximidade política’ dos veículos responsáveis pelas ‘reportagens críticas’citadas em seguida apenas de raspão. A reportagem-malabarista não assinada da Folha passa olimpicamente por indagações obrigatórias de qualquer pauta cuidadosa. Que tipo de ‘reportagens críticas’; em benefício de quem foram feitas; um trecho, um exemplo?

Nada. Na verdade, a abordagem isenta exigiria quase que uma auto-imolação do diário da família Frias, uma auto-investigação das perdas e danos causados à informação por seu esférico engajamento na candidatura José Serra , indissociável do anti-lulismo praticado disciplinadamente por quase toda a sua redação.

É inescapável recordar uma passagem que condensa a radicalização inscrita em todo esse episódio, traduzido por um jornalismo de campanha – nunca assumido abertamente – praticado pelo conjunto da mídia conservadora, sobretudo a de São Paulo. Em 4 de março de 2009, o jornal “O Estado de São Paulo”, por exemplo publicou – numa seqüência de disparos da mesma cepa deflagrados pela Folha, Globo etc – um artigo criticando de forma agressiva a pressão do governador mineiro Aécio Neves pela realização de prévias democráticas no PSDB para a escolha do postulante à Presidência da República. Àquela altura, a sempre oportuna prontidão do Datafolha dava a Serra 45% das intenções de voto, contra apenas 17% de Aécio Neves, que mal disfarçava o propósito de implodir a blindagem erguida em torno do rival paulista levando a disputa para fora do jogo de cartas marcadas arbitrado pela endogamia entre a cúpula do seu partido e a mídia do eixo São Paulo-Rio.

Os xiliques de Serra e a agressividade dos recados emitidos pelos jornais serristas demonstravam que nem um, nem outro, confiavam de fato nos confortáveis índices oferecidos à opinião pública interna e externa pelo instituto de pesquisas da família Frias. É nessa linha de tensão que surge o artigo “Pó pará, governador?” cujo título trazia uma insinuação de represálias sem limite, caso Aécio Neves insistisse em se colocar na disputa contra o tucano paulista. A sombra da represália, por certo em munição letal, tanto que Aécio desistiu da candidatura – ficava explícita no parágrafo final do recado assinado pelo versátil porta-voz de interesses inconfundíveis, o jornalista, advogado, escritor, administrador de empresas, pintor e etc, Mauro Chaves. Depois de denunciar o controle do mineiro sobre a imprensa do Estado [ "em Minas imprensa e governo são irmãos xifópagos"], o texto concluía: “Aécio devia refletir sobre o que disse seu grande conterrâneo João Guimarães Rosa: “Deus é paciência. O diabo é o contrário. E hoje talvez ele advertisse: Pó pará, governador?”.

Era uma chamada enigmática para alguns, mas inteligível para os círculos que já ouviram insinuações recorrentes sobre hábitos pessoais do governador.

É sobre esse campo minado por uma luta que dificilmente fará de Aécio um cabo eleitoral mais que formal de José Serra, que explodiu o resultado de anos de trabalho de um premiado jornalistas investigativo do país. A coleção de dados e cifras envolvendo a família, os amigos, assessores de confiança de José Serra, seus laços societários e eleitorais com a família de Daniel Dantas e as ligações do conjunto com privatizações e movimentos milionários de dólares, dentro e fora do país, formam um latejante paiol em forma livro prestes a explodir no colo da coalizão demotucana. Desdobrado em 14 capítulos, com lançamento previsto para depois da Copa do Mundo, o artefato deixa o insone assumido, José Serra, cada vez mais distante de uma noite de sono dos justos. Pior que isso: torna mais improvável ainda que ela ocorra um dia na cama do Palácio do Planalto.

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