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quarta-feira, 18 de agosto de 2010


Guerra Fria e Ditadura: as armas neoliberais contra Dilma Rousseff

Por Pedro Ayres
Jornalista
A campanha política brasileira deste ano está com forte tendência revival da Guerra Fria. Tudo porque José Serra, do PSDB, o nome chancelado, apoiado e estimulado pelo império e seus think tanks neocons, está a sofrer uma contínua queda nas pesquisas de intenções de voto. Para eles, que contavam com o retorno ao Palácio do Planalto e com o uso das centenas de bilhões de dólares do saldo da balança de pagamentos, além das riquezas do pré-sal, recursos capazes de sustentar por mais um pouco a completa débâcle neoliberal, perder a eleição é algo intolerável e que deve ser evitado por todos os meios
Assim, como não podem mais contar com os "ajustes" políticos nas pesquisas dos institutos IBOPE e DATAFOLHA, optaram pelo uso da velha tática do medo, do terror e do pânico como principal arma. Desse modo, como dispõem de revistas, jornais e canais de televisão e podem fazer rodízio sobre o mesmo material propagandístico, esta semana escolheram a revista "Época", de propriedade das Organizações Globo, para veicular uma matéria sobre o passado "guerrilheiro" de Dilma Rousseff. Matéria que há meses já tinha sido publicada em outros veículos. Até agora, pela repercussão sentida nos comentários de blogueiros e simples leitores dessa revista, o resultado é pífio ou contraproducente. Foi mais um tiro no pé, tanto que as últimas pesquisas do IBOPE definiam a vantagem de Dilma sobre José Serra em 11%, enquanto o VOX POPULI indica Dilma 45%, José Serra 29%.
Entretanto, pior do que essa ridícula tentativa de desqualificar a candidata Dilma Rousseff, é o que isso representa e que pode vir a ser algo muito mais grave em termos políticos, quanto institucionais. Para o império, fortemente golpeado pelo fracasso de seus projetos milenaristas de domínio absoluto sobre o planeta e pelo agravamento da crise econômica em sua sede metropolitana e sucursais européias, será muito difícil conviver com um Brasil autônomo, soberano e capaz de bloquear os projetos geopolíticos de um Novo Século Americano (PNAC). É, pois, a partir deste quadro geopolítico que as eleições brasileiras vão ocorrer e podem ter significativos desdobramentos caso haja um forte esvaziamento dos setores mais reacionários e entreguistas da política, com a redução numérica no Congresso e perda do controle de alguns importantes Estados da Federação. Assim, como medida "preventiva", acoplada à própria campanha eleitoral está havendo uma nítida tentativa de ressurgimento dos velhos fantasmas da Guerra Fria e de loas à legitimidade da Ditadura.
Há alguns dias, tanto na blogosfera, quanto na mídia tradicional, têm surgido artigos lamentando um possível e quase total aplastamento da oposição política ao futuro Governo Dilma Rousseff. Todos teorizam a respeito de certo desnível democrático, que consideram quase que como uma violência política, embora seja através do voto que essa modalidade de ostracismo poderá vir a existir. Há queixumes para todos os gostos. Há os que lamentam o fim do exotismo de alguns senadores. Das limitações sociais que a perda do status político poderá significar, além dos inevitáveis prejuízos econômico-financeiros que alguns sofrerão por perderem o controle de algumas importantes peças da máquina estatal. Enfim, seja de que forma for, na realidade o que os apavora, mais do que uma temporada fora do poder, é que essa temporada se torne permanente e irreversível. Ou seja, é o futuro que os ameaça, principalmente, porque depois de séculos, o futuro está sendo uma construção popular.
Quando o mundo superou as etapas escravistas e feudais, ainda que houvesse muita gritaria da parte daqueles que estavam a ver seus ganhos, privilégios e até mesmo à própria existência desaparecerem, não houve nenhuma interrupção no caminhar da humanidade, que é teleológica, segundo os senhores do saber. O fim do neoliberalismo, mesmo que doloroso e capaz de deixar imensas saudades para os seus adeptos e agentes, não determinará o fim de nada, além dessa insana proposta capitalista da eterna acumulação e concentração de riqueza e poder.
É bem interessante que, em nome de uma "necessária" política de representatividade, surjam teses que anulam séculos de pregação liberal, assim, como num passe de mágica, o voto da maioria não tem o peso justo, pois, ao "alijar" ilustres e iluminados segmentos e grupos sociais da vida política, cria enormes dificuldades para suas sobrevivências, ora no campo específico da política, ora no campo econômico-financeiro. Esta lógica acompanha aquilo que foi enunciado por Arturo Valenzuela, Subsecretário de Estado dos EUA para a América Latina, ao falar para os países latino-americanos em palestra expositora do ideário do Departamento de Estado:
"Hay una tendencia a pensar que la democracia es de las mayorías. Es como tomar la declaración de Lincoln sobre la democracia, esa que dice que es el gobierno del pueblo, por el pueblo y para el pueblo, y cambiarla por el gobierno de la mayoría del pueblo, por la mayoría del pueblo y para la mayoría del pueblo". Conclui-se, por esse raciocínio de Valenzuela, que o governo do povo não se confunde com o governo da maioria do povo. Para ele, só há democracia quando a minoria controla e detém o poder político, o que condiz com a prática histórica burguesa em suas democracias representativas. É de se notar que essas práticas históricas burguesas, em termos essenciais pouco diferem daquelas exercidas por regimes e governos ditatoriais.
A negação dessas maiorias e minorias sociais opostas entre si, serve para ocultar as tensões de uma sociedade em processo de mudança, em busca de redistribuir a riqueza ou a renda. Essa negativa não é uma formulação inocente: é a defesa do status quo vigente. Em nome desse tipo de governo à la Departamento de Estado, reagem ante possíveis leis ou reformas que impliquem tirar algo de "alguns" em benefício da maioria. Esta é a essência desse exagerado apego a uma representatividade que nunca fez parte das preocupações desses grupos, quando ainda havia o pleno domínio do "Consenso de Washington". Em outras palavras, paracumprir com seusobjetivos geopolíticos de hegemonía mundial, os países imperialistasnecessitamque os países periféricoscontinuemperiféricos e dependentes de suas estruturas capitalistas mais desenvolvidas.
Enfim, para as "viúvas", órfãos e fiéis servidores do império neoliberal, uma derrota política no Brasil, mais do que perder um pedaço do seu quintal, que consideram seu por "direito divino", é o mesmo que pregar os cravos em seu histórico ataúde, pois, projetos como a UNASUL, CALC, ALBA e MERCOSUL poderão ter livre desenvolvimento como fatores integracionistas da América Latina. Uma integração que contraria todos os desejos imperialistas de dominação e poder mundial.
No poder desde os tempos coloniais, o capitalismo que para cá veio reproduzir o modelo vigente na Europa à época dos Descobrimentos não se dá conta do caráter renovador das atuais eleições brasileiras. Dilma Rousseff não é apenas a candidata do PT e do próprio Presidente Lula. Dilma é um verdadeiro fenômeno político de proporções impressionantes, de causas históricas, sociopolíticas e culturais muito mais profundas.
De muitas maneiras, Dilma retoma o caminho da ascensão das grandes massas trabalhadoras e refaz o "fio da História" do povo trabalhador, rompido com o suicídio de Vargas, com o Golpe Militar de 1964 e governos eleitos mediante contrato entre as elites e o imperialismo, entre 1985 até 2002.
Nos sete anos do governo do Presidente Lula da Silva as forças populares obtiveram tal acúmulo de força que forjaram a unidade prática das mais importantes centrais sindicais, o fortalecimento dos movimentos camponeses liderados pelo MST e de todos os movimentos sociais significativos. Essas forças, juntas no apoio à Dilma Rousseff, significam a construção daquilo que o Departamento de Estado tanto abomina: o governo da maioria, para a maioria e com a maioria. Ou seja, uma democracia popular, nacionalista e soberana.
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Pedro Ayres
Jornalista

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