DEM sacode poeira, mas vê poucas chances de dar a volta por cima
O senador Agripino Maia (RN) assumiu a presidência do Democratas (DEM) na convenção nacional do partido, nesta terça-feira (15), em Brasília, com a alegada missão de “manter” o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, na legenda. Mas a ausência de Kassab no evento deixou claro que a primeira tarefa de Agripino já nasceu fracassada. Nos bastidores, as falas destoavam dos discursos oficiais: divisão no lugar de união.
Na pequena convenção que reuniu pouco mais de uma centena de democratas, estavam presentes todos os deputados federais e senadores do partido, bem como os dois governadores demistas: Rosalba Ciarlini (RN) e Raimundo Colombo (SC).
Os parlamentares continuam afirmando que não abandonarão o barco junto com Kassab. Mas, por precaução, o novo presidente já anuncia as possíveis retaliações. "Quem for detentor de mandato e sair, nós vamos tomar as medidas, que não são minhas, mas o que determina a lei”, disse Agripino, referindo-se à legislação que determina que o parlamentar que abandonar o partido sem causa justificável perderá o mandato.
O alerta é uma tentativa de impedir que o DEM desidrate ainda mais. Os liberais elegeram 105 deputados federais em 1998. Em 2010, a bancada demista na Câmara minguou para 44 cadeiras.
Para fugir ao vaticínio de Lula – “temos que extirpar o DEM da política” – Agripino se autoimpôs a missão de ressuscitar o ideário liberal da sigla. “Nenhum partido tem o nível de convergência que nós temos no campo das ideias”, “Somos o último partido liberal da política brasileira, a única legenda em condições de defender os princípios liberais como formulação partidária...” “...Temos orgulho de defender um tamanho adequado para o Estado, a redução da carga tributária e a irrestrita liberdade de imprensa...” “...Assumimos por inteiro a participação do capital privado nos setores em que o Estado não tem dinheiro para investir: infraestrutura, energia, aeroportos, portos...”, foram todas frases ditas por Agripino em entrevista antes da convenção.
No entanto, a desidratação do DEM aconteceu mesmo com as diversas tentativas de “modernizar” a legenda para afastar a “poeira” oligárquica, inclusive trocando de nome. Nada adiantou. Ex-Arena, ex-PDS e ex-PFL, o DEM arrosta a pior crise de sua história. O DNA direitista da legenda e sua errática oposição às políticas sociais do governo Lula tornaram inevitável a perda de prestígio do partido. Longe do poder, deixou de abrigar os políticos mais pragmáticos e fisiológicos. Restaram os mais ideológicos e tradicionalistas. Mas mesmo uma boa parte destes já não enxerga muitas possibilidades do partido dar a volta por cima.
O próprio Agripino admitiu que a saída dos parlamentares para acompanhar Kassab na formação do novo PDB ou na transferência para outro enfraquece o DEM.
Em visível agonia, o partido ainda procura tirar proveito de outro episódio que lhe enfraqueceu: a crise política protagonizada pelo ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, que, acusado de corrupção, foi preso e perdeu o mandato. Os dirigentes partidários usaram o episódio para dizer que o afastamento prévio de Arruda, grande estrela do partido, representa uma lição de moralidade. Ao mesmo tempo, Agripino Maia, em seu discurso, saudou a deputada distrital, Eliana Pedrosa, envolvida no mesmo episódio de corrupção do DF.
Tentativa inútil
A tentativa, considerada praticamente inútil pelos próprios partidários, de manter Kassab na legenda, não foi alvo explícito dos discursos, mas, nas entrelinhas, o novo presidente mandou os recados. Apesar de dizer que era conciliador e não beligerante e que tinha a missão de unir o partido, disse que "ninguém se abriga em partido de oposição por oportunismo".
Ao mesmo tempo, disse que "a minha missão é exatamente promover a conciliação, dar oportunidade a quem merece oportunidade, a quem tem capital político e eleitoral e pode contribuir com o crescimento do partido”.
Antes do início da convenção, os políticos procuravam minimizar a crise. Enquanto Ônyx Lorenzoni (RS) apostava que não sai ninguém do DEM para acompanhar Kassab, o deputado federal Rodrigo Maia (RJ), que deixa agora a presidência do DEM, disse que "movimentos das últimas horas estancaram definitivamente algum número maior de parlamentares que pudessem ir (com Kassab), não só do DEM, mas de outros partidos".
A senadora Kátia Abreu (TO), uma das que ameaçam deixar a legenda, desabafou pelo Twitter. Em uma série de postagens no início da tarde, ela criticou a atuação do ex-presidente da sigla. "Quase destruíram o DEM", disse a senadora, referindo-se a Rodrigo Maia.
Ainda no microblog, a senadora elogiou a administração do prefeito Gilberto Kassab, mas disse que “daria um voto de confiança” para o novo presidente Agripino Maia. Contudo, parece certo que Katia deixará a legenda, podendo migrar para o PDB kassabista ou para o PMDB. Mas, neste caso, ela corre o risco de perder o mandato. Segundo a assessoria de imprensa de Kátia, a senadora considera “todas as possibilidades”.
Já o deputado Pauderney Avelino (AM), escolhido vice presidente do DEM, acredita que a crise envolvendo o prefeito paulistano irá fortalecer a legenda. “O partido sai de uma crise interna fortalecido. Foi uma luta. Não é fácil passar por uma situação dessas estando na oposição. A situação do Kassab ficou insustentável (...) Acredito que a saída dele pode gerar uma paz interna duradoura”, afirma o deputado. Para Avelino, não haverá uma debandada. “Eles não se sentirão confortáveis se pairar alguma dúvida sobre a situação deles. Não é simples burlar a lei de fidelidade partidária”.
Chapa única
A movimentação de Kassab para fora da órbita tucana e em direção ao governo Dilma desagradou não só ao DEM como ao PSDB. O presidente tucano, Sérgio Guerra (PE), presente à convenção demista desta terça, lamentou a migração do prefeito. Para ele, isso representaria um enfraquecimento da oposição.
O encontro do DEM demorou uma hora para começar, e teve duração curta. O ex-presidente da legenda, deputado Rodrigo Maia, colocou em votação a chapa única, na qual o senador José Agripino assume a presidência nacional da legenda para um mandato tampão até setembro, quando nova convenção deve ocorrer, precedida de encontros estaduais
A eleição de Agripino foi a forma encontrada pelas duas alas do partido que estavam divididas e numa disputa que ameaçava 'implodir' a legenda. De um lado, o grupo do ex-prefeito do Rio, Cesar Maia, e do seu filho Rodrigo Maia. Do outro, o ex-senador Jorge Bornhausen (SC).
Nos próximos meses, Agripino correrá o país aparando desavenças. “Como em todos os partidos, temos divergências regionais”, diz ele. O senador afirmou ainda que pretende renovar todos os diretórios regionais e colocar as ideias do partido "à frente dos interesses pessoais".
Da redação, Marcia Xavier e Cláudio Gonzalez, com agências
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