Safatle: Escracho
honra o Brasil
Honrar o país
Aqueles que hoje desafiam a
mudez do esquecimento e dizem, em voz alta, onde moram os que entraram
pelos escaninhos da ditadura brasileira para torturar, estuprar,
assassinar, sequestrar e ocultar cadáveres honram o país.
Quando a ditadura extorquiu uma
anistia votada em um Congresso submisso e prenhe de senadores biônicos,
ela logo afirmou que se tratava do resultado de um “amplo debate
nacional”. Tentava, com isto, esconder que o resultado da votação da Lei
da Anistia fora só 206 votos favoráveis (todos da Arena) e 201
contrários (do MDB). Ou seja, os números demonstravam uma peculiar
concepção de “debate” no qual o vencedor não negocia, mas simplesmente
impõe.
Depois desse engodo, os
torturadores acreditaram poder dormir em paz, sem o risco de acordar com
os gritos indignados da execração pública e da vergonha. Eles criaram
um “vocabulário da desmobilização”, que sempre era pronunciado quando
exigências de justiça voltavam a se fazer ouvir.
“Revanchismo”, “luta contra a
ameaça comunista”, “guerra contra terroristas” foram palavras repetidas
por 30 anos na esperança de que a geração pós-ditadura matasse mais uma
vez aqueles que morreram lutando contra o totalitarismo. Matasse com as
mãos pesadas do esquecimento.
Mas eis que estes que nasceram
depois do fim da ditadura agora vão às ruas para nomear os que tentaram
esconder seus crimes na sombra tranquila do anonimato.
Ao recusar o pacto de silêncio e
dizer onde moram e trabalham os antigos agentes da ditadura, eles
deixam um recado claro. Trata-se de dizer que tais indivíduos podem até
escapar do Poder Judiciário, o que não é muito difícil em um país que
mostrou, na semana passada, como até quem abusa sexualmente de crianças
de 12 anos não é punido. No entanto eles não escaparão do desprezo
público.
Esses jovens que apontam o dedo
para os agentes da ditadura, dizendo seus nomes nas ruas, honram o país
por mostrar de onde vem a verdadeira justiça. Ela não vem de um
Executivo tíbio, de um Judiciário cínico e de um Legislativo com cheiro
de mercado persa. Ela vem dos que dizem que nada nos fará perdoar
aqueles que nem sequer tiveram a dignidade de pedir perdão.
Se o futuro que nos vendem é
este em que torturadores andam tranquilamente nas ruas e generais cospem
impunemente na história ao chamar seus crimes de “revolução”, então
tenhamos a coragem de dizer que esse futuro não é para nós.
Este país não é o nosso país,
mas apenas uma monstruosidade que logo receberá o desprezo do resto do
mundo. Neste momento, quem honra o verdadeiro Brasil é essa minoria que
diz não ao esquecimento. Essa minoria numérica é nossa maioria moral.
(*) Folha é um jornal que não se deve deixar a avó ler, porque publica palavrões. Além disso, Folha é aquele jornal que entrevista Daniel Dantas DEPOIS de condenado e pergunta o que ele achou da investigação; da “ditabranda”; da ficha falsa da Dilma; que veste FHC com o manto de “bom caráter”, porque, depois de 18 anos, reconheceu um filho; que matou o Tuma e depois o ressuscitou; e que é o que é, porque o dono é o que é; nos anos militares, a Folha emprestava carros de reportagem aos torturadores.
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