Mensalão vs CPI
Por Marcos Coimbra
Do Correio Braziliense
Nossa “grande imprensa” está
reagindo de forma curiosa à instalação da CPI do Cachoeira. Salvo uma ou
outra voz discordante, anda cheia de desconfianças.
No mínimo.
Em alguns casos, sua má vontade é clara. Em outros, mostra-se furiosa.
Cabe a pergunta: o que esperava
do Congresso? O que deveriam senadores e deputados fazer frente às
denúncias de que Demóstenes Torres está afundado até a raiz dos (poucos)
cabelos em gravíssimas irregularidades, assim como, em escala menor,
alguns deputados e lideranças de vários partidos?
E quanto às suspeitas que
alcançam os governos de Goiás e do Distrito Federal, a revista Veja – um
dos baluartes da imprensa de direita – e grandes empresas privadas?
Agora que pipocam indícios de todos os lados?
O certo seria que cruzassem os braços e fingissem que nada acontece?
Quando Lula e as lideranças do
PT no Congresso entraram em campo para defender a criação da CPI se
comportaram como é natural na política: perceberam que seus adversários
estavam fragilizados e agiram.
As atuais oposições fizeram a
mesma coisa quando tiveram a oportunidade. Assim como os próprios
petistas no passado, quando eram oposição e não deixavam escapar
qualquer chance de atingir o governo.
A desconfiança da maioria dos
comentaristas – e a fúria de alguns – tem a ver com a ideia de que a CPI
do Cachoeira é útil ao PT.
Existem CPIs que não são
políticas – as que investigam e propõem medidas para enfrentar problemas
sociais relevantes. Hoje, por exemplo, há três dessas na Câmara – uma a
respeito do abuso infantil, outra do trabalho escravo e uma terceira
sobre o tráfico de pessoas. Por mais meritórias que sejam, alguém
acompanha seus trabalhos e se interessa por elas, a não ser (talvez) os
especialistas?
Resultam de consensos, o
inverso do que ocorre nas CPIs políticas. Essas são invariavelmente
contra algo ou alguém – governo, governante, partido.
Se nossos comentaristas estão
desconfiados – ou apopléticos – com a CPI do Cachoeira por ela ser
política, deveriam ficar assim sempre. Todas têm “motivos secretos”,
todas visam a alcançar objetivos estratégicos.
Ingênuo é achar que o PT deixaria um escândalo como esse passar em branco, sem se aproveitar dele politicamente.
E a hipótese de a CPI do Cachoeira “nada mais” ser que uma manobra para desviar a atenção do mensalão e livrar os acusados?
Seria um ardil extraordinário,
no qual teriam que estar envolvidos Demóstenes Torres e Carlinhos
Cachoeira – para não falar dos asseclas. Sem suas centenas de conversas,
sem os fogões, geladeiras e celulares que um recebeu do outro, ninguém
nem pensaria em CPI. Ou, quem sabe, o senador seria um criptopetista?
Fora sua pouca lógica, a tese
de que a motivação última da CPI é distrair o interesse das pessoas do
julgamento do mensalão implica supor que esse interesse existe e que o
tema, para elas, é relevante. O que não faz sentido. O assunto perdeu,
há tempo, a capacidade de motivá-las.
Implica, também, imaginar que o
Supremo julga conjunturalmente, ao sabor dos humores ocasionais da
população e de acordo com o modo como a imprensa o pauta. Se as pessoas
forem “desviadas” do mensalão, será leniente. Se for pressionado, será
rigoroso. Ou seja: não age. Somente reage.
Implica acreditar que o Supremo não decide de acordo com a Lei.
No fundo, quem cultiva essas fantasias tem pequeno apreço por nossa Justiça e pela opinião pública. Ou as conhece mal.
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