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sábado, 30 de outubro de 2010

Frei Betto defende Dilma: pauta religiosa não importa à campanha

Depois de se manifestar discretamente no primeiro turno das eleições presidenciais, o escritor e frade dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, se tornou um dos protagonistas na fase final da disputa. Em meio às absurdas polêmicas religiosas impostas pela campanha do tucano José Serra – com a adesão até do papa Bento XVI –, Frei Betto emergiu como um dos apoiadores mais valorizados de Dilma Rousseff, candidata da coligação Para o Brasil Seguir Mudando.

Por André Cintra
No artigo “Dilma e a fé cristã”, publicado na Folha de S.Paulo em 10 de outubro, o líder religioso defendeu que “não passa de campanha difamatória – diria, terrorista – acusar Dilma Rousseff de ‘abortista’ ou contrária aos princípios evangélicos. Se um ou outro bispo critica Dilma, há que se lembrar que, por ser bispo, ninguém é dono da verdade”.

Nove dias depois, num ato em apoio a Dilma com mais de 2 mil pessoas no Tuca (Teatro da Universidade Católica), na PUC-SP, Frei Betto voltou a defender a candidata contra o “oportunismo” de certos segmentos religiosos. “Lamento que bispos panfletários estejam dizendo por aí tantas mentiras sobre a companheira Dilma”, discursou ele, que também espinafrou a campanha Serra. “O que esse pessoal precisa entender é que a lei do aborto não impede o aborto. O que impede o aborto é a política social, é o salário, é o Bolsa Família, é a distribuição de renda.”

Nesta entrevista ao Vermelho, Frei Betto volta a defender que, numa disputa presidencial, o mais importante é “discutir o projeto Brasil e as reformas estruturais de que o país tanto necessita”. Ele critica a pauta “artificial” do debate e também a neutralidade de Marina Silva (PV) no segundo turno. Confira abaixo.

Vermelho: O que mais diferenciou esta disputa eleitoral das anteriores?
Frei Betto: Creio que foram dois fatores. Primeiro, a entrada da Marina Silva — e a avaliação equivocada de que ela não teria expressão. A questão da preservação ambiental é uma pauta importante, e o eleitor manifestou isso. Eu só lamento que ela tenha ficado em cima do muro. Pela coerência e pela história dela, pela militância, pelos anos como ministra do governo Lula, a Marina deveria ter manifestado apoio à Dilma.

A outra grande diferença foi a predominância do aborto e da religião na pauta. São temas importantes, mas secundários numa campanha presidencial. O que importa é discutir o “projeto Brasil” e as reformas estruturais de que o país tanto necessita.

Vermelho: E, nesse sentido, o que diferencia a Dilma do Serra?
Frei Betto: A grande diferença é que a Dilma é um projeto de futuro, um projeto de continuidade a tudo aquilo que o governo Lula, o melhor da nossa história republicana, realizou. Já o projeto do Serra é a volta daquilo que nós conhecemos no governo Fernando Henrique – que é a criminalização dos movimentos sociais, a subserviência à Casa Branca, a privatização do patrimônio público e o total desinteresse e descaso com a situação dos mais pobres.

Vermelho: Num artigo recente para a Folha de S.Paulo, você defendeu que a Dilma era um exemplo de cristã...
Frei Betto: Na verdade, a Dilma não é símbolo de igreja, nem nada. Ela é uma cristã, e foi isso o que eu quis dizer, sabe? Diante das acusações infundadas de que a Dilma teria uma indiferença religiosa ou seria ateia, eu saí em defesa dela, porque a conheço desde a infância.

Vermelho: Muitas lideranças religiosas iniciaram uma espécie de cruzada eleitoral, chegando a participar até da propaganda na TV. Estamos às portas de uma guerra santa?
Frei Betto: Não, não. Eu acho que, terminada a eleição, isso desaparece. O Brasil não tem caldo de cultura para fundamentalismo religioso. Isso tudo foi artificial, incrementado por uma parcela da grande mídia que se interessou e se ancorou nesse tipo de pauta para desviar a discussão mais importante, que é sobre as reformas do Brasil.

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