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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Cadê o escândalo que estava aqui?

Luis Nassif analisa o roteiro das denúncias que tomaram conta da reta final da campanha eleitoral à Presidência
Solta-se a primeira matéria, com um suposto escândalo graúdo. No caso atual, a tal reportagem da Veja informando que Erenice Guerra recebeu propinas no valor de R$ 5,8 milhões; que tinha reuniões em sua casa com o lobista, nas quais eram proibidos equipamentos que pudessem conter gravadores; que disse que o dinheiro era para financiar atividades políticas do Planalto. Só isso. Fosse verdade, não apenas Erenice mas a República teria caído.
Uma marotagem visando eximir o lobista de apresentar provas – a história de que não podia ir a reuniões com Erenice nem com canetas – é apresentada por insigines jornalistas como prova de que os fatos ocorreram. A denúncia se resume a provas declaratórias – se é que houve – de um lobista que mentia até sobre seu cargo na empresa que assessorava.
Em cima desse fato, começam repercussões de qualquer tipo, mesmo que nada tenham a ver com a denúncia principal.  Cada denúncia, por mais besta que seja, é acompanhada de um pró-memória  de que fulano foi acusado de cobrar propinas. Não se tem um dado objetivo sequer corroborando a acusação-mãe, mas ela é repetida como se fosse verdade sacramentada.
Tome-se a Folha de hoje. A denúncia original – dos R$ 5,8 milhões destinados a abastecer o esquema palaciano – sumiu completamente do noticiário. Os ecos, não.
Matéria de primeira página sobre desvios da Universidade Nacional de Brasilia, envolvendo o irmão da Erenice. A chamada informa que o “pagamentos suspeitos incluem ao menos R$ 134 mil para o próprio Euricélio e para Israel Guerra, filho de Erenice”. Internamente, a informação completa de que Israel recebeu três pagamentos de… R$ 5 mil.
No Estadão, o repórter Leandro Colon – um campeão! – informa que o email enviado por Israel Guerra à revista Veja “passou pelo crivo do Palácio”. Antes de enviar à Veja, Israel passou a mensagem para Vinicius Castro, que fazia bicos com ele, era assessor no Palácio e foi exonerado a pedido. Na matéria de Leandro, assessor de terceira linha que recebeu o email representa “o crivo do Palácio”.
Lembra muito malandragens jornalísticas dos anos 70. Os jornalistas mais influentes tinham acesso a Golbery do Couto e Silva; os que não dispunham de fontes nobres, ao sargento Quinsan – ajudante de ordens no Palácio. Conversavam com Quinsan e atribuíam as declarações a “fontes do Palácio”.  Valia para Quinsan, mas valia para Giolbery. O Estadão – que se orgulha de ter na direção de jornalismo figuras ilustres ligadas à Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), permite que um email para um terceiro escalão seja tratado como tendo passado “pelo crivo do Palácio”.
Conclui o bravo Leandro: “Os dois são apontados como mentores de um esquema de lobby e cobrança de propinas de empresas que tentam fechar contratos com órgãos públicos ligados ao governo federal”. Cadê a Abraji? Cadê o jornalismo?
O Planalto constata que não há nenhuma evidência de que Erenice tenha praticado lobby. Merval Pereira, na rádio CBN, diz que “para evitar constrangimentos para a candidatura Dilma” o Palácio não irá demitir Erenice. Mas  traz a relevante informação de que fontes do Palácio admitem que se aparecerem outras acusações, Erenice será demitida… para proteger a candidatura Dilma. 
Uma informação tão relevante quanto dizer que se eu descobrir que Merval matou alguém, ele será denunciado. Aí se enrola todo no comentário para explicar aos atentos ouvintes porque a Erenice não será demitida para preservar a candidatura Dilma; e será demitida se aparecerem mais coisas para preservar a candidatura Dilma. Um trololó dos diabos.
Ai a brava equipe da rádio CBN em Brasilia ouve o deputado federal Paulinho Bornhausen que diz que a denúncia se refere ao maior esquema de corrupção já descoberto em Brasília. Só isso.
Tudo isso se dá ao mesmo tempo em que a revista CartaCapital revela que, no auge do boom da Internet, Verônica Serra, filha de Serra, em sociedade com Verônica Dantas, irmã de Daniel Dantas, montou um site em Miami que prometia informações bancárias sobre TODOS os brasileiros, acesso a bancos de dados de comércio exterior e outros bancos de dados do Estado brasileiro.
Informa também que o site conseguiu montar um convênio com o Banco Central que lhe repassou todas as informações, inclusive de quem emitia cheques sem fundo – que foram vazadas depois. Ora, quem acompanhava o boom da Internet sabe que, na época, a mera autorização do BC para que o site acessasse seus dados – algo inédito no mundo – teria feito seu preço valer dezenas de milhões de dólares.
A jogada não foi adiante porque a bolha da Internet estourou. Verônica conseguiu essa parceria com o Banco Central no tempo em que seu pai era Ministro da Saúde do governo. E no mesmo ano em  que ela transferiu lucros do exterior para o Brasil e comprou a casa que seus pais moravam desde os anos 80 (que diziam ser alugada) e doou ao pai. Todas essas informações (sobre a compra da casa) constam de nota oficial do próprio advogado de Serra, em 2002. Belo gesto de amor filial, mas que não pode ser visto independentemente da sua atividade no exterior.
No entanto, a primeira página da Folha é para os R$ 15 mil de Israel
Guerra.

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